Através das Pedras: O Encontro das Águas na Arte de Carmela Gross

Formada pela FAAP (Fundação Armando Álvares Penteado), em São Paulo, no ano de 1969, Carmela Gross iniciou sua trajetória artística mergulhando na arte contemporânea. Desde os tempos acadêmicos, destacou-se pelo talento e pela abertura às novas possibilidades proporcionadas pelas mídias emergentes, explorando questões conceituais que marcaram sua obra.

No contexto em que o modernismo já não oferece respostas aos avanços tecnológicos na reprodução de imagens, Carmela inovou ao adotar ferramentas como máquinas xerox, filmes em Super-8, heliografia e, principalmente, carimbos. Esses recursos foram utilizados para intervenções conceituais no universo reprodutivo, um movimento semelhante ao de artistas como Cildo Meireles, que exploraram as garrafas de Coca-Cola com mensagens serigrafadas.

Em 1968, Carmela já participava de importantes manifestações artísticas coletivas. Ao lado de nomes consagrados como Hélio Oiticica, Nelson Leirner e Rubens Gerchman, ela esteve na Praça General Osório, em Ipanema, apresentando "Bandeiras" em meio às políticas da época.

Desde então, sua carreira continua a evoluir, surpreendendo a cada nova proposta. Com mestrado e doutorado pela Escola de Comunicação e Artes da USP e estudos no European Ceramics Work Center, na Holanda, Carmela participou de diversas Bienais de São Paulo e curiosidades na América Latina, Europa e Estados Unidos.

Uma obra particularmente notável foi criada em 2001 para Laguna, Santa Catarina. Carmela concebeu o mosaico do piso de uma praça pública, batizando-o de "Fronteira Fonte Foz" . O trabalho reflete o encontro das águas – uma representação artística do ponto em que a bacia do Rio Tubarão se une ao Oceano Atlântico, indicando o movimento contínuo das marés em suas formas onduladas.

Uma referência ao piso de pedras portuguesas de Copacabana é evidente, estabelecendo um diálogo visual entre os desenhos das calçadas cariocas e o movimento das ondas no mosaico de Laguna. Esta conexão ressalta o valor histórico e cultural do projeto, que um passado e presente por meio da arte.

Laguna é uma cidade histórica de grande relevância no Brasil, cenário da tentativa de formação da República Catarinense, também conhecida como República Juliana, liderada por Giuseppe Garibaldi e Anita Garibaldi. Nesse contexto, o mosaico de Carmela Gross reforça a importância do local como ponto de encontro entre história, arte e natureza.

Além de Carmela, outros artistas consagrados exploraram o potencial das pedras portuguesas. Roberto Burle Marx destacou-se no Rio de Janeiro, enquanto Waltércio Caldas, em 1997, criou uma obra de grande visibilidade pública – "Escultura para o Rio de Janeiro" – na Avenida Beira-Mar, próximo ao Museu de Arte Moderna (MAM) .

Carmela Gross, com sua capacidade de transformar elementos simples como as pedras portuguesas em narrativas profundas, reafirma sua posição como uma das mais importantes artistas brasileiros. Seu mosaico em Laguna não apenas embeleza, mas conta histórias, conectando paisagens físicas e simbólicas em uma obra de arte inesquecível.

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